Entidades divulgam Nota de Apoio a projetos de lei sobre aplicação e tributação de agrotóxicos

28/05/2019 - Integrantes do Fórum Mato-Grossense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos, do Fórum de Luta Contra os Impactos dos Agrotóxicos do Sul de Mato Grosso e da Rede Latino-americana de Ministério Público Ambiental (Redempa) divulgaram, na manhã desta terça-feira (28), nota de apoio a dois projetos de lei de autoria do deputado estadual Lúdio Cabral.

Os PLs nº 483 e 485/2019, que tramitam na Assembleia Legislativa de Mato Grosso desde o início do mês, visam proibir a pulverização aérea de agrotóxicos em Mato Grosso e vedar a concessão de isenções tributárias à produção e comercialização desses produtos.

Os projetos propõem alterações em duas leis: a Lei nº 8.588/2006, que dispõe sobre e o uso, a produção, o comércio, o armazenamento, o transporte, a aplicação e a fiscalização de agrotóxicos, seus componentes e afins no Estado de Mato Grosso; e a Lei nº 7.098/1998, que consolida normas referentes ao Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS).

Para as entidades, as propostas são de grande relevância em um contexto de proteção à vida e ao meio ambiente contra os efeitos nocivos dos agrotóxicos. Na nota, elas salientam que a pulverização aérea é proibida na União Europeia desde 2009, por meio da Diretiva 2009/128/CE do Parlamento Europeu, uma vez que contribui para a dispersão descontrolada de substâncias químicas no meio ambiente e sobre seres humanos, aumentando os riscos decorrentes do uso e exposição ao veneno.

Sobre a tributação, a entidades explicam que as isenções fiscais atualmente concedidas sobre a produção e comercialização de agrotóxicos acabam estimulando o uso intensivo, crescente e exacerbado de produtos altamente tóxicos, em prejuízo ao meio ambiente e à saúde humana. “(...) é certo que a tributação encontra na função fiscal seu principal objetivo, o de arrecadar recursos financeiros para custear as atividades do Estado. Existe também, porém, marcante função extrafiscal no âmbito da estratégica tributária, no sentido de regular o mercado, facilitando o acesso a determinados produtos (como ocorre com produtos da cesta básica) ou desencorajando, do ponto de vista econômico, a aquisição e uso de substâncias nocivas (como ocorre com a tributação sobre o tabaco)”, diz um dos trechos do documento.

O Fórum Mato-Grossense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e o Fórum de Luta Contra os Impactos dos Agrotóxicos do Sul de Mato Grosso são coordenados pelo Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso (MPT-MT). Já a Rede Latino-Americana de Ministério Público Ambiental, pelo Procurador de Justiça Luiz Alberto Esteves Scaloppe.

Leia a íntegra da nota Apoio aos Pls 483 e 485/2019:

O Fórum Mato-Grossense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos, o Fórum de Luta Contra os Impactos dos Agrotóxicos do Sul de Mato Grosso e a Rede Latino Americana de Ministério Público Ambiental (REDEMPA) apresentam manifestação favorável aos Projetos de Lei 483/2019 e 485/2019, em tramitação na Assembleia Legislativa de Mato Grosso.

Em síntese, PL 483/2019 proíbe a aplicação aérea de agrotóxicos no Estado de Mato Grosso, enquanto o PL 485/2019 veda a concessão de isenções tributárias à produção e comercialização de agrotóxicos.

A situação quanto à exposição ao agrotóxico é alarmante no Estado de Mato Grosso, que é o maior consumidor de agrotóxicos do país, sabendo-se que a utilização desses produtos em sistemas abertos (meio ambiente) impossibilita qualquer medida efetiva de controle. Pesquisas nacionais e internacionais, e em especial da Universidade Federal de Mato Grosso, já concluíram a existência de resíduos de agrotóxicos nos rios, poços artesianos, peixes, água da chuva, sangue e urina de trabalhadores, alunos e professores de escolas próximas às áreas de plantação em que se aplica o veneno.

As providências estabelecidas nos Projetos de Lei acima referidos consubstanciam medidas de grande relevância em um contexto de proteção da vida e saúde humana e do meio ambiente contra os efeitos nocivos dos agrotóxicos.

A pulverização aérea, ao atingir grandes áreas para além da aplicada, aumenta os riscos decorrentes do uso e exposição aos agrotóxicos, contribuindo para a dispersão descontrolada de substâncias químicas no meio ambiente e sobre seres humanos. A aplicação pela via aérea não poupa lavouras, campos, rios, florestas, tribos, cidades, animais, creches, escolas, hortas e casas, não sendo por acaso a sua proibição pela União Europeia desde 2009 (por meio da Diretiva 2009/128/CE do Parlamento Europeu).

Existe ainda um fator legal, previsto tanto em normas jurídicas quanto pelas próprias empresas fabricantes destes agrotóxicos, de que as condições para a aplicação aérea destes produtos, no caso específico do Estado de Mato Grosso, simplesmente inviabilizam este meio de aplicação de venenos, uma vez que seriam necessárias temperatura, umidade e situação dos ventos específicas para esta ação. E, em Mato Grosso, estas condições são quase impossíveis de serem obtidas. Assim, por esta condição, amplamente descrita nas bulas e normas dos agrotóxicos pelos próprios fabricantes, não se poderia usar a pulverização aérea no Estado do Mato Grosso.

Deste modo, ao proibir a pulverização aérea, o PL 483/2019 consubstancia providência para proteger a vida, a saúde humana e o meio ambiente (art. 5º “caput”, art. 6º “caput”, art. 196 e art. 225 da CF/88), amparando-se na competência legislativa concorrente do Estado para legislar sobre meio ambiente (art. 24, VI e VIII da CF/88), inclusive quando aumenta o padrão protetivo à saúde (ADI 3937).

De outro lado, é certo que a tributação encontra na função fiscal seu principal objetivo, o de arrecadar recursos financeiros para custear as atividades do Estado. Existe também, porém, marcante função extrafiscal no âmbito da estratégica tributária, no sentido de regular o mercado, facilitando o acesso a determinados produtos (como ocorre com produtos da cesta básica) ou desencorajando, do ponto de vista econômico, a aquisição e uso de substâncias nocivas (como ocorre com a tributação sobre o tabaco).

Nesse contexto, isenções fiscais concedidas sobre a produção e comercialização de agrotóxicos acabam estimulando o uso intensivo, crescente e exacerbado desses produtos, em prejuízo ao meio ambiente e à saúde humana. Ao reduzir seu custo real por meio da diminuição de tributo, incentiva-se a aquisição e emprego de produtos altamente prejudiciais e tóxicos, permitindo a ampliação de passivo ambiental sem a imposição de consequência pecuniária significativa, o que viola o princípio do poluidor-pagador previsto na Constituição (art. 225 § 3º da CF).

Vê-se, assim, que uma política ambiental correta passa pela ideia de tributar com mais vigor produtos nocivos à saúde e ao meio ambiente, com o que, de resto, há uma ampliação da capacidade do Estado de prestar serviços públicos à população, em uma perspectiva da função fiscal da tributação.

Nesse sentido, o PL 485/2019, ao vedar a concessão de isenções a agrotóxicos, estabelece uma política ambiental-tributária de correta oneração de seus custos de produção e aquisição, e, consequentemente, desestimula o uso desses produtos, induzindo ainda ao surgimento de práticas agroecológicas.

Tem-se ainda a circunstância de que tanto a pulverização aérea quanto a flexibilidade de tributação do setor de agrotóxicos e do agronegócio acabam por impactar diretamente outras atividades econômicas, como a produção orgânica, a agricultura familiar, a agroecologia, a produção de mel. Isso porque a aplicação indiscriminada de veneno, especialmente pela via aérea, “espalha veneno” por uma extensa área, contaminando tudo. Além disso, não se tem, ou se tem de forma incipiente, apoios financeiros, tributários e de financiamentos para estas outras atividades econômicas.

Assim, as instâncias de articulação ora representadas vêm manifestar seu apoio aos referidos projetos de Lei, por representarem efetiva promoção de importantes bens, valores e normas jurídicas constitucionalmente relevantes, como a vida, a saúde humana e o meio ambiente.

 

Bruno Choairy Cunha de Lima

Representante da CODEMAT de Mato Grosso

Coordenador do Fórum Mato-Grossense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos

 

Leonardo Lobo Acosta

Procurador do Trabalho

Coordenador do Fórum de Luta Contra os Impactos dos Agrotóxicos do Sul de Mato Grosso

 

Luiz Alberto Esteves Scaloppe

Coordenador Executivo da Rede Latino Americana de Ministério Público Ambiental

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