Reforma Trabalhista: MPT quer anular acordo entre empresa e sindicato profissional e evitar prejuízos aos trabalhadores

26/03/2018 - O MPT em Rondonópolis deu parecer em processo movido pela Empresa Sul Americana de Montagens S A - EMSA e pelo Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Pesada e Afins do Estado de Mato Grosso (Sintecomp) para impedir a homologação, pela Justiça do Trabalho, de acordo que visa chancelar duas irregularidades trabalhistas: o atraso no pagamento de salários e o parcelamento de verbas rescisórias dos empregados da construtora.

A empresa é responsável pela obra da MT-100, no trecho que vai de Alto Araguaia a Ponte Branca. Em dezembro de 2017, o MPT, após receber relatório da Superintendência Regional de Trabalho e Emprego (SRTE-MT), ajuizou ação contra a construtora e obteve decisão liminar para impedir que esta continuasse a atrasar os salários de seus funcionários e a dividir as verbas rescisórias daqueles que tinham sido demitidos. De acordo com a CLT, o pagamento do salário deve ser feito até o 5º dia do mês seguinte ao de trabalho e as verbas rescisórias devem ser pagas em parcela única, até 10 dias após a fim do contrato de trabalho.

Considerando a decisão favorável ao MPT, a empresa procurou o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Pesada e Afins do Estado de Mato Grosso (Sintecomp) e iniciou uma negociação com a entidade. Juntos, ajuizaram uma ação com pedido de homologação de acordo extrajudicial.

Na época, a empresa ponderou estar sofrendo com os efeitos do atual período de recessão econômica no país. Alegou, ainda, atraso no repasse de verbas por parte do governo que a contratou para a realização das obras.

No acordo firmado entre a EMSA e o Sintecomp, ficou acertado que a empresa pagaria as verbas rescisórias e outros valores (como saldo de salário, férias, décimo terceiro) em sete parcelas mensais, a partir de 22 de janeiro deste ano, além da multa de 40% do FGTS.

Para o MPT, todavia, o acordo não merece chancela do Poder Judiciário. Os procuradores do Ministério Público do Trabalho em Rondonópolis, Bruno Choairy e Vanessa Martini, explicam que o salário é a principal contraprestação devida pelo empregador ao empregado, em virtude do contrato de trabalho, pois garante ao trabalhador o atendimento a suas necessidades vitais básicas e às de sua família, como moradia, alimentação e saúde.

"Os riscos do empreendimento correm por conta do empregador, a teor do art. 2º da CLT, razão pela qual a existência de crise financeira não é motivo jurídico lícito a autorizar o descumprimento de deveres trabalhistas. Sendo o empregador quem recebe os lucros de sua atividade econômica, pagando aos empregados salário, não pode impor a estes que suportem o ônus e riscos do empreendimento. Ou será que, passada a crise, os reclamados pretendem dividir lucros com seus empregados?", questionaram os procuradores.

Reforma

A Reforma Trabalhista (Lei no. 13.467/17) criou o instituto da ação de homologação de acordo extrajudicial, por meio do qual o juiz do Trabalho tem o poder de ratificar acordos extrajudiciais celebrados entre empresas e sindicatos profissionais.

Segundo o MPT, essa ação, fruto de uma Reforma Trabalhista com constitucionalidade duvidosa e discutível até os dias atuais, exige do juiz, atento à vulnerabilidade do empregado, uma intepretação cuidadosa, de modo a conformá-la aos princípios basilares do Direito do Trabalho, sob pena de acabar por prejudicar o obreiro ou até mesmo chancelar fraudes.

"É, pois, imprescindível que o magistrado, ao atuar em procedimentos desta natureza, tenha atenção e cuidado redobrados, a fim de evitar que uma suposta celeridade seja, ao fim de tudo, uma fraude com aval judicial. Em resumo, os novos acordos avalizados pela reforma não podem violar direitos previstos na Constituição Federal, como o pagamento de salários”, salientam.

Necessidades básicas dos trabalhadores

O salário foi previsto como direito fundamental na Declaração dos Direitos Humanos. Prevê que toda pessoa que trabalha deve ter uma remuneração justa e satisfatória, que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana.

Nessa mesma linha, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e o Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Protocolo de San Salvador) preveem, ambos no artigo 7º, que a remuneração é direito fundamental e tem por objetivo principal garantir a todos trabalhadores, no mínimo, condições de subsistência digna e decorosa.

A Constituição Federal também prevê o salário como direito fundamental do trabalhador, sendo que sua retenção dolosa constitui crime. Por esses motivos, afirmam os procuradores, o artigo 459, parágrafo único da CLT, determina o pagamento do salário até o quinto dia útil do mês subsequente ao vencido, assegurando um horizonte de previsibilidade, desde o qual o trabalhador estabelece suas relações em sociedade. "Sem tal horizonte de previsibilidade, falta ao trabalhador, por conseguinte, o mínimo de segurança quanto às obrigações por ele assumidas, sobretudo na condição de consumidor de produtos e serviços necessários à sua sobrevivência".

Representatividade

O MPT pontua que, ainda que se considerasse o cabimento da ação por parte da EMSA, há provas suficientes de que o sindicato não teve legitimidade na representação dos empregados. Isso porque participaram da assembleia aproximadamente 85 pessoas, as quais foram representadas pelo advogado da empresa, e não pela entidade da categoria, o que é vedado pela lei.

Com a exigência de advogados diferentes a lei visou resguardar a garantia de que os acordos fossem resultado de interesses também distintos. "O objetivo foi o de evitar situações corriqueiras na Justiça do Trabalho de petições iniciais forjadas apenas para justificar a homologação judicial”.

Além disso, nesse caso, ainda que os trabalhadores tivessem sido assistidos por advogados da categoria, a legitimidade que é conferida às entidades sindicais não permitiria que estas abrissem mão de direitos.

"Em se tratando de tutela coletiva sobre direitos individuais homogêneos, qualquer provimento jurisdicional apenas pode operar para beneficiar os substituídos. É nulo, portanto, qualquer ajuste ou acordo que vise postergar o prazo para pagamento de salário e das verbas rescisórias, eis que essas normas são de ordem pública. Daí que é irrelevante a vontade do trabalhador em concordar com o parcelamento no pagamento dos haveres rescisórios, justamente por se achar em situação de extrema vulnerabilidade, não só pela sua condição de empregado, mas também pela situação de desemprego e a necessidade premente de recebimento de valores – quaisquer valores – para manter sua subsistência”, conclui o MPT.

ACP 0000570-24.2017.5.23.0131

Informações: Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso (MPT-MT)

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