MPT defende alternativas menos agressivas ao meio ambiente e ao ser humano na produção agrícola
15/09/2015 - O Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso (MPT-MT) participou, na última sexta-feira (11), em Sorriso, da segunda audiência pública promovida pelo Comitê Multi-Institucional do Sistema Judicial de Mato Grosso este ano, com o objetivo de debater com a sociedade alternativas viáveis para reduzir a utilização de agrotóxicos no estado.
No Brasil, que carrega desde 2009 o título de maior usuário de veneno do mundo, o consumo médio de agrotóxicos é de 5,3 litros por habitante/ano. Em Mato Grosso, a média anual é quase nove vezes superior à brasileira: são 45 litros por pessoa. Em algumas regiões do estado, como a de Campo Verde, o número se aproxima aos 400 litros por habitante.
Segundo o procurador do Trabalho Leomar Daroncho, coordenador do Fórum Mato-grossense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos, a ideia levada pelo MPT ao Comitê e prontamente acolhida pelas instituições que o integram é a de fornecer informações sobre os riscos da exposição aos agrotóxicos à saúde e ao meio ambiente, bem como incentivar a realização de pesquisas para a descoberta de alternativas viáveis ao modelo de produção vigente.
“Queremos levar esse debate para as populações mais expostas, até porque os agricultores e os produtores que moram nessas regiões também estão expostos a isso e, de alguma forma, são vítimas. Infelizmente temos um modelo de pesquisa e de financiamento que induz, praticamente condiciona o emprego desse mecanismo que é totalmente dependente da utilização de produtos químicos, alguns deles bastante ofensivos à saúde humana”.
Daroncho explica que, embora Mato Grosso represente muito para o Brasil em termos de produção, sustentando atualmente até mesmo a balança comercial do país, “há uma série de estudos científicos que indicam e correlacionam a excessiva exposição ao agrotóxico a uma série de enfermidades. Por isso não é adequado que essas discussões fiquem restritas a um grupo de pessoas que têm acesso ao conhecimento”, complementa.
O procurador expõe, ainda, a sua preocupação com a elevada taxa de analfabetismo funcional da população mato-grossense, que atingiu 18,5% em 2012, segundo o Caderno de Indicadores da Secretaria de Estado de Planejamento (Seplan) divulgado este mês. Em relação às taxas de analfabetismo, o Censo de 2010 indicou um percentual de 7,1% na zona urbana contra 14,9% no campo. Diante dessa realidade, Daroncho pontua que a educação deve ser prioridade quando o assunto é diminuir os impactos dos agrotóxicos na população, especialmente nos trabalhadores.
“Hoje o analfabetismo funcional, em algumas regiões, chega a 80%, e isso é muito assustador. O que adianta ter informação na bula de um agrotóxico se quem está manuseando tem dificuldade de compreender? Ou seja, o problema é muito mais amplo do que se imagina. Temos um cenário bastante preocupante e não podemos adiar a discussão. Não estou dizendo que temos que deixar de produzir, não é isso. Temos que produzir com menos agressão. Temos que adotar modelos de cultivo em larga escala que tragam menos prejuízos a nós, seres humanos, e ao meio ambiente”.
Representando o Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região (TRT-MT), a desembargadora Eliney Veloso corroborou com esse entendimento. “O agronegócio é uma grande potência no nosso Estado, mas nós temos que caminhar no sentido de encontrar alternativas menos nefastas, menos agressivas para combater as pragas da lavoura”.
Para o presidente do Comitê, desembargador Márcio Vidal, o resultado da audiência pública foi positivo. “Foi de fundamental importância trazer conhecimento e lucidez sobre uma matéria de alta complexidade. Um assunto como este não dá para ser analisado isoladamente. É preciso vontade de todos, incluindo os atores judiciais, para conhecer a fundo a questão. Precisamos entender melhor essa temática, pois ela impacta na vida de todos nós”.
O evento foi realizado no auditório da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Sorriso e contou com a presença de cerca de 150 pessoas. Participaram da audiência várias autoridades, entre elas o prefeito da cidade, Dilceu Rossato, o secretário Adjunto de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh), Zilbo Bertoli Júnior, o juiz da 3ª Vara e diretor do Foro da Comarca de Sorriso, Anderson Candiotto, opresidente da OAB - Subseção de Sorriso, Evandro Santos da Silva, o advogado Waldir Caldas Rodrigues, presidente da Comissão de Direito Carcerário da OAB/MT, entidades de classe como Aprosoja e Famato, além de outros produtores rurais, pesquisadores de universidades, médicos e engenheiros agrônomos.
Proibição
A pedido da juíza federal da Segunda Vara da Seção Judiciária de Mato Grosso, Vanessa Curti Perenha Gasques, a audiência pública também foi utilizada para instruir uma ação civil pública ajuizada em 2014 pelo Ministério Público Federal (MPF) contra o Instituto de Defesa Agropecuária do Estado de Mato Grosso (Indea-MT), a União e o Estado de Mato Grosso para impedir o uso de agrotóxicos com o princípio ativo “benzoato de emamectina”. Isso porque, para combater a lagarta Helicoverpa armigera, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) emitiu em 2013 uma Declaração de Emergência Fitossanitária no estado e permitiu a importação do produto, até hoje proibido no Brasil.
O “benzoato de emamectina” não possui registro no país e sua utilização não é indicada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Segundo o MPF, o produto não atende sequer ao requisito básico para a liberação do registro emergencial: a baixa toxidade. “O uso de agrotóxicos que contêm essa substância atende exclusivamente aos interesses econômico e político, desconsiderando os interesses ambientais e, principalmente, a proteção à saúde humana contra uma substância altamente tóxica”, afirmou, na ocasião da propositura da ação, o procurador da República Felipe Bogado.
“É um tema de muita importância porque trata da saúde coletiva. A sociedade precisa discutir essa questão. Hoje temos ações ajuizadas que visam proibir determinados agrotóxicos e precisamos ter conhecimento sobre o assunto, sobre essa temática tão específica. Essa oportunidade é para debater e trazer conhecimentos para as pessoas que atuam neste segmento, incluindo a área jurídica”, frisou a juíza Vanessa Gasques.
MPT em Quadrinhos
Durante a audiência pública, o Ministério Público do Trabalho (MPT) lançou a 19ª edição da série “MPT em Quadrinhos”. De maneira lúdica, intuitiva e com recursos simples das histórias em quadrinhos (HQs), a revista pretende informar sobre os prejuízos do manejo e descarte incorretos de embalagens de agrotóxicos e reforçar a necessidade de utilização de equipamentos de proteção antes, durante e depois da aplicação do veneno nas lavouras.
As revistas podem ser lidas ou baixadas diretamente no site do projeto pelo computador, smartphones e/ou tablets. As temáticas tratadas nas HQs são as mais diversas. Entre os assuntos já abordados estão o contrato de trabalho, a segurança na construção civil, os assédios moral e sexual, o estágio, a inclusão social e os trabalhos escravo, infantil e doméstico.
O material é de autoria do MPT no Espírito Santo e pode ser reproduzido e compartilhado gratuitamente. Desde que foi lançado, o “MPT em Quadrinhos” já distribuiu cerca 600 mil cópias impressas em todo o Brasil.
Informações: Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso (MPT-MT)
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Fotos: Reginaldo Castro Maia/PTM Cáceres