MPT defende patamar civilizatório de direitos para trabalhadores de aplicativos em nova regulação
Coordenador nacional da Conafret reforça entendimento da Instituição de que, pela legislação atual, esses trabalhadores têm vínculo empregatício com as empresas
18/11/2021 - Pela legislação trabalhista brasileira atual, os trabalhadores que exercem atividade de transporte de passageiros e entrega de mercadoria, com uso de plataformas digitais, têm vínculo trabalhista com as empresas que os contratam. E uma nova lei a ser votada pelo Congresso Nacional para a regularização profissional destes trabalhadores de aplicativos deve garantir um patamar civilizatório mínimo de direitos. As duas afirmações foram feitas pelo coordenador nacional de Combate às Fraudes nas Relações do Trabalho (Conafret) do Ministério Público do Trabalho, Tadeu Henrique Lopes da Cunha, em debate sobre o tema realizado nesta terça-feira (16/11) na Câmara dos Deputados.
Durante a tarde de ontem, deputados, representantes de sindicatos e cooperativas de motoristas, da Justiça Trabalhistas e da academia discutiram o tema em debate promovido por duas comissões da Casa. Os discursos mostraram a dificuldade de consenso sobre a melhor forma de tratar o tema e aprovar uma proposta regulamentando a prestações de serviços por meio de aplicativos no Brasil, com garantia de direitos aos trabalhadores e a viabilidade do modelo de negócio de empresas como Uber, 99, Uber Eats, Ifood, Rappi.
O coordenador nacional da Conafret destacou que o MPT vem atuando nesse tema desde 2015, porque já recebia denúncias, e que criou um grupo de estudos para investigar como se dá a relação entre empresas e os trabalhadores de aplicativos, especialmente de transporte de passageiros e de mercadorias. O MPT abriu mais 600 procedimentos desde então e entende que o vínculo trabalhista existe, com base em artigos 2ª, 3º e 6º da CLT, com elementos que caracterizam uma relação de trabalho como subordinação, fixação de preços por essas empresas e punição.
Tadeu da Cunha acrescentou que o MPT já ajuizou 12 Ações Civis Públicas com pedido de vínculo trabalhistas, além de 12 ações para garantia de medidas sanitárias e de auxílio financeiro a estes trabalhadores durante a pandemia. Para o coordenador, uma relação de emprega têm características e uma regulamentação que crie uma “nova figura” não poderá se confundir com relação de emprego. E que assegure direitos aos trabalhadores.
“A Constituição Federal, por seu artigo 7º, tem uma série de direitos, que são assegurados não somente aos trabalhadores empregados, mas também ao avulsos que não têm vínculos. O artigo 7º é um marco civilizatório de direitos. Se vier alguma regulamentação por essa Casa, que se atente à Constituição Federal como forma de garantir um patamar civilizatório de direitos mínimos a esses trabalhadores”, afirmou Tadeu da Cunha.
Garantia de Direitos
Representando a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Rodrigo Trindade reforçou que, independentemente da forma de contratação, se empregado com vínculo ou autônomo, é necessário assegurar na nova lei condições mínimas de civilidade aos trabalhadores. Ele também criticou o fato de as plataformas se negarem a estabelecer uma negociação com trabalhadores com o argumento de que apenas intermedeiam a relação entre clientes e prestadores de serviços autônomos.
Presidente da Frente de Apoio Nacional dos Motoristas Autônomos (Fanma), Paulo Xavier Júnior ressaltou que 99% dos motoristas de aplicativos não têm interesse em vínculo empregatício, mas esperam que a regulamentação garanta o mínimo de proteção à categoria. “Não queremos vínculo, porque inviabilizaria para usuários e plataformas. Se ficar ruim, ela (empresa) fecha e vai embora do país. E são cerca de 2 milhões de trabalhadores que dependem dessa renda”, disse Xavier Júnior.
O debate foi promovido pela Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público e pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços, a pedido dos deputados Afonso Motta (PDT-RS) e Augusto Coutinho (Solidariedade-PE), que é relator de propostas em tramitação na Câmara sobre o assunto. “Esta Casa, de fato, precisa se debruçar sobre como fazer isso. É preciso que exista esse serviço, mas também que a relação [entre trabalhadores e empresas] seja sadia e sem precarização”, sustentou o relator.
Autor de um dos projetos que tramitam sobre o tema, o deputado Henrique Fontana (PT-RS) disse que o atual modelo de negócios de plataformas explora trabalhadores. “Que possamos votar um desses projetos. O que não podemos é continuar com esse falso livre mercado, que impõe condições arbitrárias, que precarizam, pagam mal e não garantem direitos elementares a milhões de brasileiros”, acrescentou.
Presidente do Sindicato dos Motoristas de Transporte Privado Individual de Passageiros por Aplicativos do Rio Grande do Sul, Carina Trindade, reforçou: “A categoria quer ter assegurados direitos, como férias, pausa para alimentação, reajuste salarial etc.”
Para o deputado Kim Kataguiri (CEM-SP), ao aprovar uma nova regulamentação para o segmento de serviços por aplicativos, o Congresso precisa considerar que o aumento de custos para as empresas pode resultar em remuneração menor para os trabalhadores ou em aumento no preço do serviço.
Prestadores independentes
Conselheira da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (Fecomércio-SP), Maria Cristina Mattioli, que é ex-desembargadora, defendeu que os trabalhadores de aplicativos sejam definidos como prestadores de serviço independentes (PSIs). “Elaboramos um anteprojeto que visa garantir a esse PSI a ampla proteção social já existente na lei, seja como MEI ou por recolhimento como contribuinte individual”, disse.
Doutora em Sociologia, Ana Cláudia Cardoso sustentou que a legislação valha não apenas para motoristas do transporte individual de passageiros e para entregadores de produtos. “Empresas de plataformas já estão em todos os setores. Vamos criar uma legislação específica para cada plataforma que atua em cada setor diferente?”, questionou.
Assista aqui à audiência pública.
Assista aqui a participação do coordenador nacional da Conafret.
Informações: PGT com Agência Câmara de Notícias